floquinhos

domingo, 15 de março de 2009

EM EPOCA DE TEMPORAIS, DE TROVOADAS...


Estamos em março, finalzinho de verão, época de tempestades que assolam cidades e campos, muitas vezes trazendo destruição, morte, tristezas...
E nós que somos simples mortais, enfrentamos um temporal cada qual a sua maneira. Quando eu era menina, via uma de minhas tias fazer cruz de sal, esconder ovos, cobrir espelhos, queimar palma benta (conseguida na missa de Ramos), rezar para Santa Bárbara, enfim, todo um ritual que o medo que a dominava comandava, deixando a nós, crianças crédulas e indefesas ainda mais apavoradas, assustadas, amedrontadas. Lembro-me, hoje, disso tudo até com uma certa saudade porque, parafraseando Fernando Pessoa, nesse tempo, "no tempo em que festejavam o dia dos meus anos, todos estavam vivos..." Doces tempos...

Mas falava sobre formas de reagir diante de uma trovoada... Cada qual reage conforme seus conhecimentos, suas crendices, sua cultura, enfim, cada qual à sua moda. Mas ainda não vi ninguém que ficasse indiferente diante das forças da natureza. Agora, os poetas!... ah, essas mentes privilegiadas e sensíveis!... Esses arautos dos nossos sentimentos vão buscar em seus temores ou até mesmo em suas indiferenças, temas para suas criações.
Como não nos comovermos com Castro Alves clamando as forças da natureza no afã de apagar uma vergonhosa nódoa que cobria nosso país, em "Navio Negreiro":

“... Astros! Noites! Tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!”

Ou o próprio Fernando Pessoa, cismando sobre rezar ou não para Santa Bárbara, crer ou não em Santa Bárbara:

– “... Quando os relâmpagos sacudiam o ar
E abanavam o espaço
Como uma grande cabeça que diz não,
Não sei porque – eu não tinha medo –
Puz-me a rezar a Santa Bárbara
Como se fosse a velha tia de alguém...
...
Sentia-me alguém que possa acreditar em Santa Bárbara...
Ah, poder acreditar em Santa Bárbara!”

E como eles, tantos outros poetas maravilhosos deixaram registradas sensações, medos e emoções gerados pela fúria da natureza em algum momento de suas vidas. Tal como alguns pintores que passaram esses mesmos sentimentos para telas famosas, ou músicos que os usaram para encantar gerações, cada qual, enfim, à sua maneira deixa registrados com arte e maestria preciosos momentos de força e beleza... Sim, porque ninguém há de querer negar que há uma intensa beleza num raio que risca os céus numa noite de verão, nas águas que jorrando lavam os campos e trazem a vida, no arco-írIs que vêm finalmente anunciando a calma após a tempestade...

Dulce Costa
Numa quente manhã de domingo, que prenuncia possiveis temporais sobre a cidade para mais tarde.

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