floquinhos

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

NO AZUL DE UM DIA CINZENTO


E o dia amanhece em paz...
Não descerrei ainda as cortinas de meu quarto, mas imagino que o dia esteja azul, de um céu sem nuvens, de um sol começando a rasgar a noite, infiltrando seus raios pelos cantos os mais obscuros da cidade, suponho flores de um jardim se abrindo ao som de uma musica doce que se espalhe pelo ar, Há um bem-te-vi alardeando sua presença no beiral de minha janela...
Encolho-me entre os lençóis, ainda de olhos fechados, sentindo cada centímetro de meu corpo agradecendo esse momento de aconchego e, automaticamente estendo meu braço que desliza sobre a cama e só encontra o vazio... e a realidade cai sobre mim. Recolho meu braço lentamente e me encolho ainda mais diante dessa ausência já tão longa e ainda tão sentida.
E a saudade que me chega é doce. Vem em forma de um olhar profundo, sereno, de uma voz forte, que se modulava acariciante quando o amor preenchia cada milímetro de nossos corpos, de braços que envolviam com ternura, de ombros aonde eu repousava confiantemente minha cabeça nos momentos mais difíceis, numa longa, longa caminhada pela vida.
Mas ele se foi. A vida o levou quando, filhos já criados, o tempo poderia ser então só nosso... Tínhamos ainda planos, tantos... Havia tanto ainda a fazer, tantos lugares do mundo a espera de um par de corações prontos para se deslumbrarem diante de cada momento, havia nosso canto aonde finalmente podíamos viver um para o outro, um pelo outro... Mas ele se foi...
E faz anos que estou aqui, tentando enganar a mim mesma, dizendo que tudo está bem, que houve uma superação, que estou feliz. Feliz? Afinal, o que é, como é, realmente estar feliz? Se estar feliz é estar-se em paz consigo mesma e com a vida, estou feliz. Se estar feliz é ter motivos para agradecer a Deus pelos filhos, netos, nora, amigos, sim, estou feliz, muito feliz... Se estar feliz é ter-se um cantinho aconchegante aonde se possa ainda sonhar, Ah, claro que estou feliz... Mas se para se estar feliz for preciso um outro braço que nos abrace, uma presença que nos acolha com carinho, um ser que nos envolva com amor, uma doce mão que segure a nossa num caminhar, sereno, a outra metade de nós, ah.. ai estou feliz pela metade, porque se tenho tudo isso em minhas lembranças, formou-se um vazio em minha realidade, em meu coração...
E pensando nisso tudo, pesando cada ponto, minha conclusão acalma minha alma porque apesar da ausência, minha vida tem todos os motivos do mundo para seguir em paz... E afinal, ninguém pode ser feliz o tempo todo. Estar-se feliz é questão do momento. E, neste momento, confesso que estou sim, feliz...
Aberta a janela de meu quarto, o dia é cinza, enfarruscado, meio triste... e daí? Busco meu solzinho interior e vou para mais um dia desta minha caminhada, num dia que se inicia azul dentro de mim...

Dulce Costa
SP / 28 de janeiro de 2009

2 comentários:

Anônimo disse...

Olá Dulce.
Os seus textos soam, aos meus ouvidos, como verdadeiros poemas.
Hoje, senti um grande sentimento de culpa, pelas vezes que me aborreço quando alguma atitude de meu marido me desagrada. Afinal é tudo tão insignificante diante da dor da ausência da pessoa que amamos. Nem consigo imaginar.
Mas é como escreve, temos que desfrutar a felicidade daquilo que temos, pois nos casos como o seu não há remédio.
Beijinhos

UBIRAJARA COSTA JR disse...

Obrigada. Lourdes,
Na vida a dois temos sempre nossas diferenças, nossos momentos de incompreensão. As vezes, brigamos por qualquer coisa, perdemos fácil a paciência... É assim mesmo...
Mas temos sempre que nos lembrar que cada pessoa é única, portanto, diferente de nós. Como único é cada momento que juntos passamos. Único e precioso... E por isso devem ser vividos com carinho...
Beijos